28.5.10

Deixa-me ouvir o que não ouço...
Não é a brisa ou o arvoredo;
É outra coisa intercalada...
                     É qualquer coisa que não posso
                     Ouvir senão em segredo,
                     E que talvez não seja nada...

Deixa-me ouvir... Não fales alto !
Um momento !... Depois o amor,
Se quiseres... Agora cala !
                     Tênue, longínquo sobressalto
                     Que substitui a dor,
                     Que inquieta e embala...

O quê? Só a brisa entre a folhagem?
Talvez... Só um canto pressentido?
Não sei, mas custa amar depois...
Sim, torna a mim, e a paisagem
E a verdadeira brisa, ruído...
Vejo-me, somos dois...

Fernando Pessoa, Poesias Inéditas

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